8 DE MARÇO,
DIA DA MULHER E POESIA
Três Poetas Mulheres
Especial: Luis Augusto Cassas
Micheliny Verunschk
i
o amor são ossos zigomáticos
e músculos piramidais
a epiderme sob a luz
a carne que em carne
se refaz
o amor é tão somente o hiato
e a coluna vertebral
tarso metatarso e as falanges
falo e útero
o salto do animal
tecido e pedra
fibra e úmero:
o amor
que o meu corpo
atravessa
pousa somente
no corpo que vislumbro
ii
não há metafísica no amor
somente a mão
somente a pélvis
o esterno
e o pescoço em giro breve
todo sorriso (saiba) é feita de nervos
e ligamentos
as quadraturas da pele
em seus desdobramentos
não há metafísica no amor
somente o osso
(escápula, tíbia, fêmur)
o pelo
a carne
e todos seus unguentos
iii
o amor só entende
o osso
o sacro
o ísqui
o ílio
suas cavidades
e fossos
o amor só atende
ao osso

i
mulheres de Jerusalém,
vocês viram o meu amado?
pomar de romãs
meu vinho meu leite
revoada de pássaros
mirra incenso
falo
[o meu amado
passou sua mão
pela fresta da porta
meu coração
entre seus dedos
estremeceu:
eu sou do meu amado
e ele é meu]
ii
mulheres de Jerusalém
se encontrarem meu amado
digam que lhe guardei uma flor
semiaberta
entre as pernas
digam
que desfaleço
e morro de amor
[o meu amado
ergue-se
Monte Carmelo
tenda no deserto
torre do Líbano
suas pernas, torres
sua coroa, lírios]
seus canais
e cristas
suas linhas
e esboços
o amor se distende
em osso
suas ligas
forames
seus
ramos
seus poços
o amor só se rende
ao osso
iv
o amor é
o osso hioide
essa ponte levadiça
sobre o espaço
essa ponte que eleva
a língua
até o palato
o amor
é esse pacto
o amor é
a mandíbula
essa sorte
sempre móvel
e que mastiga
o que é lasso
o que é duro
o que fustiga
o amor é
essa intriga
o amor é
esse dente
estrutura
perfurante
e saliente
o que ataca
o que mordisca
o que se sente
o amor
esse acidente
o amor é
esse osso
que sustenta
beijo
fala
e seus esboços
suas artérias
tubulações
seu alvoroço
o amor é
esse osso
outro
cântico
iii
mulheres de Jerusalém
foi por entre as romanzeiras em flor
que o meu amado me beijou
e embaixo da macieira
sua língua
cítara
entre meu dentes
[o meu amado
passa a mão
em minha cintura
e me conduz
ao jardim
de todas as venturas
o meu amado é belo
como o cedro
e o seu amor
mirra da mais pura]
iv
mulheres de Jerusalém
procurei o meu amado
e não o achei
dizem que o amor
é mais forte que a morte
mas a saudade
é pedra e sepultura
aloé açafrão e nardo
nada sara essa ferida funda
[vento do oriente
soprem
seu perfume sobre mim
e deixem que o meu amado
me apascente
e como dos frutos
do seu jartim]
v
mulheres de Jerusalém
eu quero o meu amado
e o meu amado me quer
meu nome gravado em seu anel
meu cabelo enroscado no seu brinco
seu amor oásis de leite e mel
seu desejo marfim e vinho tinto
[é doce beijar o meu amado
seus olhos sua testa
a curva do pescoço
os seus lábios
e espero
como a pomba
aguarda a primavera
para conduzi-lo
ao jardim
mais aromático].

Micheliny Verunschk. Maravilhas Banais.Editores Micheliny Verunschk/Martelo Casa Editorial e
Comércio de Livros, 2017.
do amor e seu osso
